O galã relutante

Por Redação O Estado de S. Paulo - 17/09/2025 07:36

O cabelo loiro ondulado, o sorriso de garoto e os olhos azuis fizeram de Robert Redford um cobiçado galã de Hollywood. Mas o ator americano soube transcender a aparência, em filmes que marcaram época, com seu ativismo político, a disposição em aceitar papéis menos glamourosos e a dedicação em fornecer plataformas para filmes de baixo orçamento.

Redford morreu nesta terça-feira, 16, aos 89 anos, durante a noite, em sua casa no Estado americano de Utah. Lá criou, em 1985, um dos mais importantes festivais de cinema do mundo, Sundance. A ideia veio da observação de que Hollywood, com os anos, se tornava mais cautelosa e controladora. Redford havia comprado um terreno com a esperança inicial de abrir uma estação de esqui. Em vez disso, Park City se tornou um lugar de descoberta para futuros grandes cineastas como Quentin Tarantino, Steven Soderbergh, Paul Thomas Anderson e Darren Aronofsky.

"Para mim, a palavra a ser sublinhada é independência", disse Redford em 2018. "Sempre acreditei nessa palavra. Foi isso que me levou a criar uma categoria que apoiasse artistas independentes que não tinham a chance de serem ouvidos. A indústria era controlada pelo mainstream, do qual eu fazia parte. Mas eu via outras histórias que não tinham a oportunidade de serem contadas e pensei: talvez eu possa dedicar minhas energias a dar uma chance a essas pessoas. Olhando para trás, me sinto bem com isso."

ESTRELATO. Redford chegou a Hollywood no início dos anos 1960 e, antes que a década acabasse, alcançou o estrelato com a comédia romântica Descalços no Parque, de 1967, baseada na peça de Neil Simon. No longa, ele e a atriz Jane Fonda interpretavam recém-casados às voltas com as dificuldades do início da vida - narradas com magia e encanto pelo diretor Gene Saks.

O sucesso foi enorme, mas o fez hesitar e recusar dois convites, para Quem Tem Medo de Virginia Woolf? (papel ficou com George Segal) e A Primeira Noite de um Homem (que rendeu a Dustin Hoffman indicação para o Oscar) - Redford não queria ficar estereotipado como galã romântico. E, em 1969, consolidou de vez seu nome na indústria com Butch Cassidy, em que contracenava com o ator Paul Newman.

Após Butch Cassidy, de 1969, Robert Redford voltaria a trabalhar com Paul Newman em 1973, em Golpe de Mestre. O filme venceu o Oscar e Redford recebeu com ele sua primeira indicação para o prêmio de melhor ator. Naquele ano, concorreu com o Al Pacino de Serpico, o Marlon Brando de O Último Tango em Paris e o Jack Nicholson de A Última Missão. Perderam todos para Jack Lemmon, protagonista de Sonhos do Passado. Também no final de 1973, Redford voltaria ao drama com Nosso Amor de Ontem, dirigido por Sidney Pollack, no qual contracenou com Barbra Streisand.

Já em O Grande Gatsby, de 1976, ele atuou ao lado da atriz Mia Farrow na trama baseada no livro de F. Scott Fitzgerald e dirigida por Jack Clayton a partir de um roteiro de Francis Ford Coppola. No mesmo ano, viria um dos marcos centrais de sua carreira: Todos os Homens do Presidente, thriller político sobre a investigação, por jornalistas do The Washington Post, do escândalo de Watergate, que eventualmente levaria à renúncia do presidente americano Richard Nixon. O ator foi um dos primeiros a ver o potencial cinematográfico da história, e logo garantiu os direitos para o filme.

Redford dizia se identificar com personagens "individualistas e idealistas". "Se encontro um papel que sinto ser capaz de habitar, então sou capaz de interpretá-lo com verdade e mostrar isso ao público", disse em uma entrevista ao Boston Globe. Ao mesmo tempo, porém, dizia se sentir à vontade com personagens à margem. "Desde criança, eu sempre tentava me libertar dos limites aos quais estava preso, sempre queria sair."

Além de Todos os Homens do Presidente, Redford flertou com a política no cinema no filme O Candidato, de 1972, uma sátira sobre um idealista que decide concorrer a uma vaga no Senado norte-americano. A frase final do filme entrou para a história do cinema americano: "O que fazemos agora?", pergunta o personagem após ganhar a eleição. Ele também viveu um funcionário da CIA em Três Dias do Condor, de Pollack (1975).

DIREÇÃO. Nos anos 1980, no auge de sua fama, Redford diminuiu sua participação em filmes - ainda que tenha estrelado Entre Dois Amores, de 1985, vencedor do Oscar, contracenando com Meryl Streep. Ao mesmo tempo, começou a se voltar com ênfase para a direção. Ganhou o Oscar na categoria com Gente Como a Gente, de 1980, que bateu Touro Indomável, de Martin Scorsese; e nas décadas seguintes lançaria ainda produções como o lírico Nada É Para Sempre e Quiz Show - A Verdade dos Bastidores, sobre escândalos em torno de um gameshow de televisão dos anos 1950 e a obsessão nacional americana com vencer (pelo filme, ele também seria indicado para o Oscar de melhor diretor).

Foi também nesse momento que ele passou a se envolver de maneira ainda mais sistemática com o Instituto Sundance, criado ainda nos anos 1970, e o festival, que nasceria em 1985. Sua colônia de artistas, ele explicava, não dizia respeito a insurgentes descendo das montanhas de Utah para atacar o cinema do mainstream, mas de ampliar o próprio conceito de mainstream.

Redford também usou a fama para chamar atenção para a luta pelo meio ambiente, inspirada, ele diria em uma entrevista, pelo fato de ter testemunhado a transformação de Los Angeles em uma cidade de poluição e rodovias. Suas atividades foram desde o lobby pela Lei do Ar Limpo e pela Lei da Água Limpa até a participação ativa no Conselho de Defesa dos Recursos Naturais.

Preferindo a vida em seu rancho isolado em Utah, Redford criou a imagem de um astro relutante. Sua carreira em Hollywood, ele insistia em entrevistas, com sua teimosia característica, era incidental às suas verdadeiras preocupações. O ator, no entanto, não gostava de ser chamado de ativista, um rótulo que considerava severo demais.

MARVEL. Entre 2001 e 2013, ele faria apenas oito filmes, com destaque para Até o Fim, no qual era o único ator e interpretava um náufrago. O longa lhe rendeu algumas das melhores críticas de sua carreira. Em 2014, com Capitão América: O Soldado Invernal, entrou para o universo Marvel ao viver Alexander Pierce um dos diretores da S.H.I.E.L.D - na verdade, um agente infiltrado de um grupo terrorista.

Ele voltaria a viver o papel em Vingadores: Ultimato. E, em 2018, atuou no que chamou de seu filme de despedida, O Velho e a Arma (2018). "Eu apenas considero que tive uma longa carreira com a qual estou muito satisfeito. Tem sido tão longa, desde que eu tinha 21 anos", disse ele à imprensa pouco antes do lançamento do filme nos EUA. "Eu acredito que, agora que estou chegando aos 80 anos, talvez seja a hora de me aposentar e passar mais tempo com minha esposa e família." (Com informações de agências internacionais)