Governo Trump contradiz Moraes e diz que Filipe Martins não entrou nos EUA em 2022

Por Marcelo Godoy e Hugo Henud - 10/10/2025 20:23

O governo dos Estados Unidos desmentiu nesta sexta-feira, 10, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e afirmou que o ex-assessor de Jair Bolsonaro, Filipe Martins, não entrou em território americano em 30 de dezembro de 2022, data usada pelo magistrado para justificar sua prisão preventiva na ação penal do golpe.

Em nota oficial, o Serviço de Alfândega e Proteção de Fronteiras (CBP) informou ter realizado uma "revisão minuciosa das evidências disponíveis referentes às alegações de entrada" e concluído que não há registro da entrada de Martins no país na data indicada.

"Após a conclusão da análise, foi determinado que o Sr. Martins não entrou nos Estados Unidos nessa data", diz o comunicado. "Essa constatação contradiz diretamente as afirmações feitas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, indivíduo recentemente sancionado pelos Estados Unidos por violações de direitos humanos contra o povo brasileiro."

O texto afirma ainda que o registro incorreto utilizado por Moraes para embasar a prisão de Martins foi incluído de forma errônea nos sistemas oficiais da agência, que abriu investigação interna para apurar o caso.

"A inclusão desse registro inexato nos sistemas oficiais permanece sob investigação, e o CBP tomará as medidas apropriadas para evitar futuras discrepâncias", afirma a nota.

A CBP também declarou "condenar veementemente qualquer uso indevido desse registro falso para sustentar a condenação ou prisão de qualquer pessoa", e reafirmou seu "comprometimento com a integridade dos registros de fronteira e com os princípios de justiça e direitos humanos".

O comunicado foi divulgado dias após a conversa telefônica entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente norte-americano Donald Trump, ocorrida na segunda-feira, 7.

O episódio marcou um novo gesto de aproximação política entre os dois líderes, após um período de tensionamento diplomático entre Brasília e Washington. A reabertura do diálogo ocorre em meio a ofensiva nos últimos meses do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e do comentarista Paulo Figueiredo, que vinham articulando com autoridades americanas e defendendo a adoção de sanções contra ministros do STF.

Essas articulações resultaram na revogação de vistos e na aplicação da Lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes e sua esposa.

O advogado Ricardo Fernandes, que defende Martins, classificou a nota do governo americano como "grave" e disse que ela confirma que seu cliente foi mantido preso de forma abusiva e ilegal por mais de seis meses. Segundo ele, o próprio comunicado da CBP comprova que o registro usado por Alexandre de Moraes para justificar a prisão era fraudulento e não poderia ter embasado qualquer decisão judicial.

"Isso agora está sendo investigado não só pelo CBP, mas também pelo FBI e por outros órgãos dos Estados Unidos, que buscam apurar como o registro falso foi inserido e utilizado e o grau de envolvimento de autoridades brasileiras nessa trama", disse o advogado.

Entenda o caso

Filipe Martins, ex-assessor especial de Jair Bolsonaro, foi preso em 2024 por ordem de Alexandre de Moraes na investigação sobre a tentativa de golpe de Estado. Um dos elementos citados pelo ministro foi o suposto embarque de Martins na comitiva presidencial para Flórida em 30 de dezembro de 2022 - o que, segundo a revisão feita pelo CBP, nunca ocorreu.

A defesa sustenta que o ex-assessor permaneceu no Brasil no período apontado e apresentou provas de registros de celular, transações bancárias e deslocamentos internos.

Os advogados também alegam que o registro usado como base para a prisão apresentava erros , entre eles a grafia incorreta do nome de Filipe - escrito com "e" - e o uso de um passaporte cancelado, o que reforçaria a tese de que o documento foi inserido ou alterado de forma irregular nos sistemas migratórios dos Estados Unidos.

Em depoimento, Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator na investigação, também afirmou ao STF que Martins não embarcou no voo presidencial.

O ex-assessor move ainda uma ação na Justiça dos Estados Unidos para esclarecer a suposta fraude nos registros migratórios. O processo, aberto em janeiro de 2025 no Tribunal Distrital da Flórida, tem como partes o Departamento de Segurança Interna (DHS) e o CBP, e foi apresentado sob a Lei de Acesso à Informação americana (Freedom of Information Act).

Martins busca identificar quem inseriu ou alterou o registro que apontava sua entrada nos EUA em 30 de dezembro de 2022, informação agora oficialmente negada pelo próprio governo americano.